Como funciona a guarda compartilhada de cachorro
Não é segredo para ninguém que os divórcios só crescem no Brasil: de acordo com informações obtidas pelo IBGE e divulgadas pela revista IstoÉ[1], em um período de cinco anos o número de divórcios aumentou mais de 70%. O problema é que, segundo o mesmo instituto, o país é o segundo maior em número de pets por família e atualmente é mais fácil encontrar um cachorro ou um gato do que uma criança em uma casa brasileira, conforme informações divulgadas da revista Exame[2].
Eis o problema: no divórcio, existe guarda compartilhada para os animais de estimação? Apesar de ainda não existir lei específica sobre esse tema, saiba que seu bichinho não está desamparado: confira no umCOMO tudo sobre como funciona a guarda compartilhada de cachorro.
Guarda compartilhada de animais no divórcio
Como dissemos, ainda não há uma lei no Brasil que regule a guarda compartilhada de animais no divórcio. Atualmente, tramita no Congresso Nacional o PL n° 542/2018, que visa por fim de uma vez por todas a essa ausência de segurança que afeta diversas famílias.
Contudo, como há na legislação brasileira a previsão de que "quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais do direito"[3], juízes e tribunais vêm tomando as medidas cabíveis para garantir o bem-estar dos tutores e dos animais. Há quem diga, inclusive, que tratam-se de famílias multiespécie, tendo em vista que o afeto é o que primordialmente constitui uma família.
Em 2018, o Superior Tribunal de Justiça deu uma decisão[4] no seguinte sentido:
[...] 5. A ordem jurídica não pode, simplesmente, desprezar o relevo da relação do homem com seu animal de estimação, sobretudo nos tempos atuais. Deve-se ter como norte o fato, cultural e da pós-modernidade, de que há uma disputa dentro da entidade familiar em que prepondera o afeto de ambos os cônjuges pelo animal. Portanto, a solução deve perpassar pela preservação e garantia dos direitos à pessoa humana, mais precisamente, o âmago de sua dignidade. 6. Os animais de companhia são seres que, inevitavelmente, possuem natureza especial e, como ser senciente - dotados de sensibilidade, sentindo as mesmas dores e necessidades biopsicológicas dos animais racionais -, também devem ter o seu bem-estar considerado. 7. Assim, na dissolução da entidade familiar em que haja algum conflito em relação ao animal de estimação, independentemente da qualificação jurídica a ser adotada, a resolução deverá buscar atender, sempre a depender do caso em concreto, aos fins sociais, atentando para a própria evolução da sociedade, com a proteção do ser humano e do seu vínculo afetivo com o animal. [...]
Ok, temos guarda garantida. Mas como funciona a guarda compartilhada de cachorro? É o que veremos a seguir.
Como funciona a guarda compartilhada de cachorro
De acordo com artigo publicado pelo Instituto Brasileiro de Direito de Família[5], a guarda compartilhada de cachorro pode funcionar da seguinte forma:
- O pet mora com um dos tutores, mas o outro tutor tem livre acesso a ele;
- Deve haver uma relação harmoniosa entre os tutores;
- Os tutores podem se organizar livremente quanto à questão de tempo, horários e períodos passados junto ao pet;
- As despesas com o animal de estimação deverão ser dividas igualmente entre os tutores.
Há também a possibilidade de se adotar uma guarda alternada, por exemplo, o cachorro passa duas semanas com um tutor e duas semanas com o outro. Nesse caso, também se divide as despesas (banho, tosa, saúde, alimentação, etc).
Como conseguir a guarda de um cachorro
Uma vez que você e seu/sua parceiro(a) optaram pelo divórcio consensual, isto é, em que ambas as partes concordam, é de bom tom fazer uma discussão prévia sobre como ficará a guarda do cachorro (se será compartilhada, alternada, como funcionará a divisão de custos e a responsabilidade de cada um dos tutores, etc).
No pedido de divórcio é preciso pedir ao advogado que inclua uma cláusula sobre a guarda do animal de estimação, com todas as especificações citadas. Uma vez que o STJ já tem uma decisão positiva nesse sentido, é difícil que o juiz se oponha a realizar a divisão da guarda. Veja um exemplo[6]:
[...] DO ANIMAL DE ESTIMAÇÃO
O casal possui um cachorro, contraído na constância do casamento, que atende pelo nome de “Marley”, com idade de cinco anos. Os requerentes estão de comum acordo que o cachorro ficará com o cônjuge varão, e nos dias em que estiver de serviço (dois dias por semana), o referido animal ficará com a cônjuge varoa, podendo gozar de sua guarda um final de semana por mês, sem prejuízo, a ambas as partes, da perda definitiva da guarda compartilhada, pela prática de violência ou maus tratos ao animal, de acordo com o artigo 32º, da lei nº 9.605/98.
Não obstante, fica acordado que as despesas com veterinário, medicamentos, vacinas e internações serão compartilhadas entres os cônjuges, e as despesas referentes a alimentação e higiene serão custeadas pelo cônjuge varão.
Apesar do Código Civil ainda classificar o referido animal como semovente, e pela ausência de normas que regulamentem o compartilhamento da guarda de animal de estimação, direito a ser tutelado em decorrência da relação afetiva desenvolvida, roga-se pela homologação com fulcro no art. 4º da lei nº 4.657/42, que prevê, quando omissa a lei, a decisão consonante com a analogia, os costumes e os princípios gerais do direito. Ademais, reafirma a jurisprudência em RESP 673.214 acerca da relevância desse vínculo afetivo, reconhecendo estudos sobre a matéria que qualifica “os animais não humanos como seres sencientes com um sistema nervoso cientificamente capaz de sentir dor e experimentar outras emoções, incluindo sofrimento e angústia.” Sendo assim, faz-se imprescindível a convivência compartilhada do animal entre as partes a fim de minimizar o seu sofrimento em decorrência do distanciamento do casal, em detrimento à dissolução do casamento.
Caso um dos cônjuges seja contra a guarda compartilhada do cachorro, é preciso que o advogado representante da parte que deseja ter a guarda faça o pedido ao juiz, apontando que as partes não concordam nesse aspecto. Avaliando a situação econômica da família e a disponibilidade de tempo de cada um dos tutores, o juiz decidirá pelo tipo de guarda que considerar mais adequado para aquela situação em específico.
Ou seja, para conseguir a guarda de um cachorro, basta fazer a requisição ao judiciário. Nós do umCOMO também recomendamos a leitura de nosso artigo sobre como se separar.
Se pretende ler mais artigos parecidos a Como funciona a guarda compartilhada de cachorro, recomendamos que entre na nossa categoria de Leis.
- ISTOÉ. Número de divórcios cresce na pandemia e gera oportunidades de negócio. Disponível em: <https://www.istoedinheiro.com.br/numero-de-divorcios-cresce-na-pandemia-e-gera-oportunidades-de-negocio/>. Publicado em 11 de março de 2021. Acesso em 28 de julho de 2021.
- EXAME. Brasil poderá ter marco regulatório dos animais de estimação. Disponível em: <https://exame.com/brasil/brasil-podera-ter-marco-regulatorio-dos-animais-de-estimacao/>. Publicado em 20 de janeiro de 2020. Acesso em 28 de julho de 2021.
- BRASIL. Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del4657compilado.htm>. Acesso em 28 de julho de 2021.
- SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. REsp nº. 1.713.167 – SP. Inteiro teor. Recorrente: LMB. Recorrido: F.M.R.B. Relator: Ministro Luis Felipe Salomão. 2018. Disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ITA&sequencial=1717000&num_registro=201702398049&data=20181009&formato=PDF>. Acesso em 28 de julho de 2021.
- MOREIRA, Natália Pereira. A tutela dos animais de estimação nos casos de divórcio e dissolução da união estável em face da regulamentação brasileira. Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM). Disponível em: <https://ibdfam.org.br/artigos/1707/A+tutela+dos+animais+de+estima%C3%A7%C3%A3o+nos+casos+de+div%C3%B3rcio+e+dissolu%C3%A7%C3%A3o+da+uni%C3%A3o+est%C3%A1vel+em+face+da+regulamenta%C3%A7%C3%A3o+brasileira#_ftn1>. Publicado em 28 de maio de 2021. Acesso em 28 de julho de 2021.
- LIMA, Rick. Ação de divórcio consensual.<&a