Como tirar o nome do pai biológico da certidão

Como tirar o nome do pai biológico da certidão

Vivemos um problema no Brasil: o abandono paterno. Diversos homens deixam seus filhos aos cuidados das mães e não prestam qualquer tipo de assistência, o que pode ser motivado pelo machismo estrutural: eles não se veem como responsável pela família e pelos filhos, tendo isso em mente como "coisa de mulher". Dados do IBGE divulgados pelo portal G1[1] confirmam esse abandono, já que em 2015 haviam quase 12 milhões de famílias comandadas por uma mãe solo no país. Dentro desse contexto de não se sentir representado pelo sobrenome paterno na certidão de nascimento ou até mesmo se sentir psicologicamente mal por estar atrelado a esse nome, muitas pessoas desejam tirar o sobrenome do pai biológico de seus documentos pessoais. Confira no umCOMO informações sobre como tirar o nome do pai biológico da certidão.

Como tirar o nome do pai dos documentos

Como falamos anteriormente, as razões para querer tirar o nome do pai biológico da certidão são muitas. Contudo, esse processo não é tão simples assim.

Como tirar o nome do meu pai da certidão

O principal problema para tirar o nome do pai biológico da certidão é a proteção legal que o Estado confere ao nome do indivíduo, que é um direito de personalidade e, por isso, intransferível e irrenunciável. O artigo 16 do Código Civil, por exemplo, garante que "toda pessoa tem direito ao nome, nele compreendidos o prenome e o sobrenome".

Ou seja, quando o legislador fala em irrenunciável, ele quer dizer que não se pode abrir mão até mesmo de um sobrenome, mesmo que voluntariamente.

Para além disso, a Lei de Registros Públicos disciplina que:

Art. 56. O interessado, no primeiro ano após ter atingido a maioridade civil, poderá, pessoalmente ou por procurador bastante, alterar o nome, desde que não prejudique os apelidos de família, averbando-se a alteração que será publicada pela imprensa.

Logo, não há algo como "com quantos anos posso tirar o nome do meu pai" na legislação brasileira. Você pode alterar seu próprio nome (mudando de Julia para Nídia, por exemplo), em até um ano a partir do dia que você completar 18 anos, mas não pode alterar os sobrenomes (o que o legislador chamou de apelidos de família).

Para tentar mudar essa situação e tirar o nome do pai biológico dos documentos, como também o sobrenome do pai, você terá que contratar um advogado e ingressar com uma ação judicial. Atualmente muitos juízes possuem uma postura mais progressista e aceitam fazer a alteração, mas essa não é a regra.

Para dar o início ao processo, é preciso que você tenha sua certidão em mãos. Se esse não for o caso, veja como obtê-la em Como tirar a segunda via da certidão de nascimento.

Ação para retirar nome do pai da certidão de nascimento

Já há casos na justiça onde o autor conseguiu remover o sobrenome paterno. Em 2014, por exemplo, o Superior Tribunal de Justiça decidiu pela supressão do sobrenome paterno no Recurso Especial nº 1.304.718 - SP. Como se trata de uma das mais altas cortes do país, a tendência dos tribunais estaduais e dos juízes de piso é acompanharem esse posicionamento.

No caso em questão, o recorrente foi abandonado pelo pai na infância e sua criação foi dada pela mãe e pela avó, como se vê em muitas famílias brasileiras. O ministro relator do caso, Paulo de Tarso Sanseverino, entendeu que:

[...] o nome é elemento da personalidade, identificador e individualizador da pessoa na sociedade e no âmbito familiar, resta caracterizado o justo motivo do recorrente [...] Ademais, o direito da pessoa de portar um nome que não lhe remeta às angústias decorrentes do abandono paterno e, especialmente, corresponda à sua realidade familiar, parece-me sobrepor ao interesse público de imutabilidade do nome, já excepcionado pela própria Lei de Registros Públicos.

Seu advogado pode usar essa tese ao fazer o pedido na ação para retirar nome do pai da certidão de nascimento. Como o próprio ministro relata ao longo do seu voto nesse caso, já há vários casos semelhantes que tiveram um desfecho favorável no sentido de alteração do nome no STJ. Não custa tentar, certo?

Como colocar o nome do padastro na certidão de nascimento

Às vezes o pai biológico não é presente na vida da criança, e sim o padrasto: o termo jurídico para esse caso é "filiação socioafetiva". Nesses casos, a lei hoje já autoriza que se acrescente o sobrenome do padrasto à certidão de nascimento, o que confere diversos direitos ao filho "adotado", como o à herança, por exemplo.

O nome do pai biológico não fica excluído, apenas é adicionado um novo nome, como dispõe o parágrafo 8° do artigo 57 da Lei de Registros Públicos.

De acordo com o provimento 63 de 2017 do Conselho Nacional de Justiça[2], no que diz respeito à paternidade socioafetiva:

  • O reconhecimento poderá ser feito em qualquer cartório de registro civil de pessoas naturais;
  • O pedido de reconhecimento pode ser feito por maiores de dezoito anos;
  • No caso dos maiores de doze anos e menores de dezoito, sua opinião deverá ser consultada e ele ou ela deverão autorizar a inclusão do novo sobrenome;
  • Os filhos da adoção socioafetiva possuem os mesmos direitos e obrigações que o filho biológico.

A adoção socioafetiva não desobriga o pai biológico do pagamento da pensão alimentícia. Confira nosso artigo sobre como calculá-la.

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Referências
  1. VELASCO, Clara. Em 10 anos, Brasil ganha mais de 1 milhão de famílias formadas por mães solteiras. G1. Disponível em: <https://g1.globo.com/economia/noticia/em-10-anos-brasil-ganha-mais-de-1-milhao-de-familias-formadas-por-maes-solteiras.ghtml>. Publicado em 14 de maio de 2017. Acesso em 24 de março de 2020.
  2. BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Provimento Nº 63 de 14/11/2017. Institui modelos únicos de certidão de nascimento, de casamento e de óbito, a serem adotadas pelos ofícios de registro civil das pessoas naturais, e dispõe sobre o reconhecimento voluntário e a averbação da paternidade e maternidade socioafetiva no Livro “A” e sobre o registro de nascimento e emissão da respectiva certidão dos filhos havidos por reprodução assistida. Disponível em: <https://atos.cnj.jus.br/atos/detalhar/atos-normativos?documento=2525>. Acesso em 24 de março de 2020.
Bibliografia
  • BRASIL. Código Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm#tituloi>. Acesso em 24 de março de 2020.
  • BRASIL. Lei nº 6.015/73. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L6015consolidado.htm>. Acesso em 24 de março de 2020.
  • BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial (Resp) nº 1.304.718 - SP. DIREITO CIVIL. REGISTRO CIVIL. NOME. ALTERAÇÃO. SUPRESSÃO DO PATRONÍMICO PATERNO. ABANDONO PELO PAI NA INFÂNCIA. JUSTO MOTIVO. RETIFICAÇÃO DO ASSENTO DE NASCIMENTO. INTERPRETAÇÃO DOS ARTIGOS 56 E 57 DA LEI N.º 6.015/73. PRECEDENTES. Relator: Ministro Paulo de Tarso Sanseverino. Brasília - DF. 18 de dezembro de 2014. Diário da Justiça Eletrônico. Disponível em: <http://tmp.mpce.mp.br/orgaos/CAOCC/dirFamila/jurisprudencia/Decisao.STJ.Registro.Civil.Nome.inf.Marco.pdf>. Acesso em 24 de março de 2020.